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Foto do escritorRoberto Schultz

TECNOLOGIA: QUANDO A ADMINISTRAÇÃO ESPECIFICA "ALHOS" NO EDITAL E ACEITA "BUGALHOS" NA PROPOSTA.


Por ROBERTO SCHULTZ.



Há casos que ainda causam algum espanto em licitações, especialmente naquelas licitações que tratam de TECNOLOGIA e que, em tese, deveriam seguir rigorosamente as especificações técnicas cuidadosamente especificadas no edital.


Nesse sentido, incomoda um pouco que certos órgãos da Administração façam “vistas grossas” para determinados índices de desempenho, ou de operacionalidade, ou características mínimas nas configurações dos equipamentos, que são estabelecidos no edital e que; sendo descaradamente descumpridos por alguns licitantes, ainda assim são aceitos e está “tudo bem” para o pregoeiro ou para a área técnica.


Descumprir o edital não é “estar tudo bem”.


Neste ponto, esse procedimento “tolerante demais” pelos servidores (pregoeiro e área técnica) sempre suscita as costumeiras suspeitas.


Vejam que estou falando em suspeitas dos licitantes; pode não estar acontecendo nada disso na vida real. Mas é o que todo mundo pensa, logo de cara.


A primeira; e mais óbvia, é sobre possivelmente estar ocorrendo favorecimento do licitante faltoso. Favorecimento é corrupção, peculato. Não tem outro nome para isso. Mesmo que não envolva dinheiro. Se você, servidor público, favorece alguém porque é “amiguinho” daquela empresa ou “não gosta” da outra empresa e permite que uma delas descumpra o edital, você estará considerando todos os demais licitantes uns trouxas. É como se o pregoeiro dissesse: "você decidiu cumprir o edital? Maravilha, pois agora mudamos de ideia e vamos aceitar quem não o cumpriu".


A segunda também é recorrente. É a suspeita de “preguiça” o que em termos de terminologia criminal poderia se chamar de desídia. Algo do tipo “ah, não vamos polemizar, vamos aceitar assim mesmo, senão esse negócio não acaba nunca e precisamos licitar logo”. Ou “a nossa verba tem prazo limite para ser utilizada” (esta pode ser, aliás, outra motivação dentro da motivação preguiça).


E a terceira é o edital feito “na coxa”; um “copia e cola” de editais anteriores, que não deixa de ser um derivado da preguiça, mas que também pode ser uma maneira rápida de resolver uma situação premente, e a necessidade de licitar porque se precisa do bem ou do serviço. E que, no decorrer do procedimento, a Administração decide que pode ser aceito algo ligeiramente diferente do que foi publicado no edital.


Enfrentamos o caso de um órgão cujo edital exigiu desktop (computadores) em cuja configuração constasse um processador que atingisse uma pontuação X mínima no site SPEC (que pontua performances e as publica; quem é do ramo conhece) e o licitante classificado como vencedor ofertou processador com pontuação abaixo da inferior.


Incomoda profundamente ao licitante que participa, quando isso acontece, porque este se programou (inclusive financeiramente) para cotar preços que contemplem todas as características, imaginando que elas fossem ser exigidas de todos os participantes. Ninguém cota um preço aleatoriamente.


E pelas características técnicas do processador ofertado pela empresa que foi declarada vencedora, seria tecnicamente impossível atingir-se aquele mínimo obrigatório de desempenho. Quer dizer, "descumpri o edital e ainda venci, como sou esperto!".


O mais surpreendente, no entanto, foi a manifestação da área técnica do órgão licitante, acerca da manifestação de inconformidade que apresentamos.


Aliás, diga-se, manifestação que também foi feita por uma outra licitante e no mesmo sentido. Esse tipo de situação deveria acender uma “luz de alerta” na Administração. Ainda mais no caso mencionado, quando as inconformadas com a classificação da empresa que descumpriu o edital eram duas empresas licitantes (e concorrentes entre si, que não se conheciam); donde se presume alguma experiência técnica de ambas, e que possuem o mesmo ponto de vista sobre o descumprimento técnico pela vencedora.


Isso, por si só, já mereceria uma revisão na classificação.


A resposta da área técnica foi algo do tipo “embora tenha sido especificada memória com frequência mínima de 3200MHZ e o processador ofertado pela vencedora suporte frequência máxima de memória inferior a isso (ou seja, a Administração admitiu expressamente que havia descumprimento do edital), a mesma (memória) tolera trabalhar em velocidades inferiores à sua velocidade nominal, sem prejuízos, sendo assim compatível com o processador”.


Numa situação assim, o que se faz? Havia uma especificação MÍNIMA exigida no edital e a Administração, ainda assim, e admitindo expressamente isso, capitula para aceitar quem não ofereça SEQUER O MÍNIMO, apostando em variações que nunca estiveram no edital.


A partir da Legislação, e do edital, e de todos aqueles princípios constitucionais (isonomia, vinculação ao edital, legalidade, bla-bla-bla...); e que também são da Lei de Licitações, e que estamos cansados de conhecer e de repetir, a possibilidade de aceitar-se algo diferente do edital não poderia ser sequer considerada, quanto menos aceita e expressamente declarada.


Quando se fala em edital a Administração não pode, como fez tal órgão, falar que a configuração técnica está “especificada“ no edital. Essa é uma visão cômoda e que, aos incautos, dá uma ampla margem para acreditar que se trata de uma “mera referência”. E não é. Quando se fala em edital a configuração técnica está, ali, sendo EXIGIDA (negrito, maiúsculas, sublinhado) e não meramente “especificada”.


Não se pode aceitar que o comando do edital seja um aperto de mão frouxo, e incerto, molenga, sem compromisso, falso. O edital é um aperto de mão firme e forte, convicto. O que está ali pode ser exigido e não apenas “especificado”. É um compromisso.


Porque se não for assim o órgão e/ou a sua área técnica “criam uma regra especial” para a licitante vencedora (e descumpridora), regra aquela que não estava no Edital e cujo conhecimento NÃO FOI DADO aos demais licitantes.


Além dessa TOLERÂNCIA TÉCNICA, a licitante vencedora, num caso assim, obtém nítida VANTAGEM DE PREÇO sobre os demais licitantes que optaram por SEGUIR O EDITAL E A LEGISLAÇÃO QUE MANDA SEGUIR O EDITAL.


Quer dizer, no momento em que o licitante “Joãozinho-do-passo-certo” CUMPRE O EDITAL E, COM ISSO, TAMBÉM CUMPRE A LEI ofertando um processador com o DESEMPENHO MÍNIMO EXIGIDO pela Administração; e com isso REDUZ A SUA MARGEM DE LUCRATIVIDADE E AINDA APRESENTA PREÇOS MAIORES, um outro licitante, que “cruza os braços” diante do Edital e diz “não vou cumprir o Edital e nada irá me acontecer”, oferta um processador com o DESEMPENHO ABAIXO DO MÍNIMO EXIGIDO e, por isso, oferta preços bem mais competitivos.


E a “penalidade” para o descumpridor ainda é vencer o pregão!!!


Façamos uma comparação.


Suponhamos um pregão para o fornecimento de veículos (caminhonetes) e não de computadores.


Nesta licitação para a compra de veículos, o edital EXIGIU uma caminhonete Ranger(veículo pesado, 3.270 kg), e com potência MÍNIMA de 200 cv, a fim de que o motor possa suportar o peso do veículo e também atingir uma certa velocidade.


E a licitante vencedora IGNOROU SOLENEMENTE ESSA REGRA e ofertou uma caminhonete Ranger, com o mesmo peso e características, porém com potência MÁXIMA de 100cv.


Abaixo do exigido.


E, MESMO NÃO ATENDENDO À REGRA EXPRESSA DO EDITAL, foi CLASSIFICADA e vencedora, quem sabe por causa de um PREÇO MENOR.


O preço proposto pela vencedora, obviamente, foi MENOR, e não é muito complexo calcular que ele só foi menor POR QUE NÃO ATENDEU À EXIGÊNCIA DO EDITAL.


No entanto, o parecer da área técnica do órgão, e que manteve a licitante descumpridora classificada, por seu teor; ainda que com um viés um pouco diferente (por tratar de memória e de processador), nessa licitação hipotética das caminhonetes, diria o equivalente ao seguinte:


Embora tenha sido exigido no edital uma caminhonete Ranger (3.270 kg) e que devesse ter um motor com a potência mínima de 200 cv e que fosse capaz de atingir determinada velocidade, o veículo ofertado pela licitante vencedora é uma Ranger com os mesmos 3.270 kg que possui um motor com potência máxima de 100 cv, mas consideramos que mesmo esse utilitário sendo pesado, o motor pode suportá-lo e tolera trabalhar em velocidades inferiores sem prejuízos, sendo assim compatível com o peso da caminhonete.”


E foi mais ou menos isso o que manifestou o órgão, na licitação de computadores, que eu mencionei.


A questão é que, DEPOIS DE PUBLICADO O EDITAL, não estamos falando de “compatibilidade”; conforme foi mencionado no parecer da área técnica do órgão em questão, mas da existência de uma EXIGÊNCIA PRÉVIA E MÍNIMA.


Que NÃO FOI ATENDIDA pela licitante vencedora e que mesmo assim foi aceita pelo órgão em questão.


Há forum adequado para as reclamações cabíveis? Por certo que há.


Os impulsos de 85% dos licitantes são “vamos ao presidente (ou secretário, ou diretor, autoridade máxima, seja lá qual for) do órgão”. O segundo é “vamos ao Tribunal de Contas”; seja o estadual ou o da União. E o terceiro é “vamos para o Judiciário”. Não necessariamente nessa ordem.


Mas ainda é perturbador, e injusto, e financeiramente caro, que tenhamos que recorrer sempre à “porrada”, quando isso deveria se auto regular pelo próprio edital ou taxativa e fielmente aplicar-se a regra do edital, para todos.


Isso deveria, no lado da Administração, começar a ser punido.


Punição para os corruptos, sempre. Mas também para os preguiçosos e para os negligentes.





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